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Roosevelt prolongou a Grande Depressão?

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Texto de David Gordon, publicado originalmente no Mises Institute

Robert Murphy demonstra neste excelente livro uma habilidade penetrante para explicar a essência de doutrinas newdealeconómicas falaciosas. Como ele nota, há três teorias que oferecem visões concorrentes para explicar a Grande Depressão: a visão Keynesiana, que enfatiza a falta de procura agregada; o monetarismo de Milton Friedman que atribui a severidade dos primeiros anos da Grande Depressão a um corte drástico na oferta de moeda pela Reserva Federal; e, claro, a teoria austríaca que o próprio Murphy defende.

Herbert Hoover, embora não sob a influência de Keynes, defendeu uma versão da primeira teoria. Se os salários não se mantivessem altos, o poder de compra seria insuficiente para restaurar a prosperidade. Consequentemente, Hoover encorajou as empresas a refrear-se no que toca a cortes salariais.

Murphy expõe rapidamente a falácia desta visão:

Os salários altos não causam prosperidade, ao invés são um indicativo de prosperidade. Em último caso, não importa quantos pedaços de papel verde é que os empregadores entregam aos trabalhadores. A não ser que, em primeiro lugar, os trabalhadores produzam os bens (e serviços), não haverá nada nas prateleiras das lojas para eles comprarem quando tentarem gastar os seus cheques gordos. (p. 35)

Mas, pode ser contra-argumentado, os níveis de produção e emprego não são determinados pela procura agregada? Tomando como garantido que a prosperidade requer bens reais, os homens de negócios não irão decidir quanto produzir baseado no que pensam que irão vender? Se assim for, o problema numa depressão não é que, prevendo que a procura futura será baixa, estes cortam na produção?

Murphy, mais uma vez, encontra a falácia fundamental. O problema numa depressão não é que a produção, em geral, seja demasiado baixa, mas sim que os recursos não foram colocados ao seu melhor uso e precisam de ser reafectados:

Ao focar-se nas condições monetária agregadas tais como “pagamento total de salários”, Hoover negligenciou completamente o facto de que os recursos físicos reais tinham que ser reafectados para corrigir os desequilíbrios na economia. Não eram as “empresas” que estavam a produzir demais, mas antes que alguns sectores estavam a produzir demasiado, enquanto outros sectores, na economia, estavam a produzir de menos, à luz da oferta de recursos, aptidões e desejos dos seus trabalhadores, assim como dos gostos dos consumidores. (p.37)

Mais uma vez, Murphy mantém que nos devemos concentrar nos bens físicos, ao invés da procura monetária total.

A única forma de retificar a situação – de mudar a economia para uma configuração sustentável – era ao realocar recursos e trabalhadores. Algumas empresas tinham que ser fechadas imediatamente, libertando os trabalhadores e matérias-primas que teriam sido consumidas se as empresas tivessem continuado abertas… Mas numa economia de mercado, os trabalhadores são livres de escolher a sua ocupação, e os proprietários das matérias-primas de poder vender a sua propriedade a quem desejarem. No entanto, com essa liberdade vem a infeliz necessidade de períodos prolongados de desemprego e “recursos parados”, enquanto os trabalhadores e matérias-primas estão à procura de uma nova casa na economia. (pp.37-38).

Murphy despacha a visão monetarista como semelhante frontalidade e facilidade. Aqui as suas observações têm ainda um significado mais vital, já que o [ex-]Presidente da Fed, Ben Bernanke, abraça firmemente a explicação monetarista da Grande Depressão.

Ele encontra uma maneira simples de ilustrar a falácia da análise “mainstream” da deflação. De acordo com esta visão, se as pessoas anteciparem preços em queda, irão abster-se de gastar. Como esperam que os preços caiam, pensam que farão melhor em consumir mais tarde. Mas esta queda do consumo, causa uma consequente queda de preços, e todo o ciclo se repete. Os preços podem entrar numa espiral de queda.

Murphy responde desta maneira:

Podíamos construir um argumento análogo para a indústria dos computadores, no qual o governo aprova regulações para abrandar modernizações nos sistemas operativos e na velocidade de processamento. Afinal de contas, como é que os fabricantes de computadores se conseguem manter viáveis se os consumidores estão sempre à espera que um modelo mais rápido esteja disponível?… A solução para este paradoxo é que, obviamente, os consumidores decidem morder o isco e comprar um computador, sabendo muito bem que poderiam comprar a mesma “performance” por menos dinheiro, se estivessem dispostos a esperar… (Não faz sentido esperar por preços mais baixos, mas nunca comprar!) (pp. 68-69)

A engenhosa resposta de Murphy pode também ser aplicada para combater o famoso modelo de George Akerlof do mercado de carros usados. Arkelof argumentava que, devido à informação assimétrica, os donos de bons carros usados tenderiam a ser afastados do mercado. Mas, ao contrário do que este modelo sugere, os bons carros usados são vendidos. Para Murphy, da mesma maneira podemos dizer que lá porque os proprietários de bons carros possam não obter um preço tão alto como desejariam, não significa que se vão recusar, de todo, a vender.

Poderá ajudar adicionar o “efeito de verdadeiro equilíbrio” à explicação de Murphy. Enquanto os preços caem, o valor do dinheiro sobe. A procura das pessoas por poupar dinheiro podem então ser satisfeita com menos dinheiro. Isto em parte explica porque é que as pessoas eventualmente gastam, mesmo quando esperam que os preços continuem a cair.

Os keynesianos contraporão que mesmo que a despesa eventualmente recupere, o processo leva demasiado tempo. As pessoas não podem esperar enquanto os mercados se ajustam. Mas isto é ignorar o ponto principal de Murphy. O processo de ajustamento é o que é preciso: uma depressão é exactamente a situação em que maus investimentos são liquidados e os recursos movidos para outro lugar.

Murphy revela outra falha no ataque convencional à deflação. O dinheiro que não é gasto, não precisa de ser entesourado, como os opositores da deflação assumem implicitamente:

Muitos analistas que estão aterrorizados com a deflação, sublinham que num contexto de queda de preços, o dinheiro enfiado debaixo do colchão ganha um retorno positivo. Certamente que esta observação é verdadeira mas, no entanto, o dinheiro emprestado consegue ainda um maior retorno. Os preços em queda encorajam então os consumidores a devotar mais do seu rendimento para poupanças, o que por sua vez baixam as taxas de juro e permitem às empresas pedir mais emprestado e investir. (p. 69)

Como o autor mostra abundantemente, a evidência histórica desfere golpes decisivos tanto na teoria monetarista, como na keynesiana. Na visão keynesiana, o aumento da despesa, ao restaurar a procura agregada, vai fazer voltar os dias bons. Se assim é, porque é que a despesa massiva de Hoover e Roosevelt deixou a América atolada na depressão? Chamar Hoover de gastador pode surpreender muitos leitores, mas Murphy nota que não há espaço para dúvidas:

A resposta de Hoover ao crash do mercado bolsista foi um enorme aumento na despesa governamental, com o orçamento a explodir 42% nos primeiros dois anos… é verdade que Hoover pestanejou e tentou domar os défices sem precedentes (na altura) em anos de paz. Mas isto só depois da abordagem dos “estímulos” falhar horrivelmente. (p. 48)

Os keynesianos responderão que a despesa governamental deveria ter sido ainda maior; mas isto é adicionar um epiciclo para reforçar uma teoria falhada.

Murphy vira-se então para Milton Friedman, que enfatizou as provas estatísticas, ao mostrar que o monetarismo falha em explicar os dados.

Vemos que imediatamente após o crash do mercado bolsista, a Fed começou a inundar o mercado com liquidez e de facto puxou as suas taxas de juro para limites baixos recorde… Se a pretensa causa da Grande Depressão – o único facto que a separou de todas as depressões anteriores – foi a reluntância da Fed de providenciar a liquidez necessária, então como é que os cortes recorde na taxa de juro se provaram inadequados para resolver “o problema”? (pp.. 76-77)

Mesmo que isto seja verdade, Friedman não poderá na mesma dizer que o declínio massivo na oferta de moeda no princípio dos anos 30 exacerbou a severidade da depressão? Murphy, na senda de Murray Rothbard, nega-o:

Entre 1839 e 1843 a oferta de moeda caiu 34% e o grosso dos preços caiu 42%. Se os monetaristas estiverem certos, que tenha sido a recusa da Fed em contrariar a queda da oferta de moeda no princípio dos anos 30 a dar-nos a Grande Depressão, então o período de 1839-1843 deveria ter sido devastador. No entanto Murray Rothbard (ao apoiar-se na pesquisa histórica de Peter Temin) relata o contrário (p. 71)

Se as teorias monetarista e keynesiana não conseguem enfrentar as evidências históricas, será que que a teoria austríaca fará melhor? Na visão Austríaca, as depressões aparecem porque a expansão de crédito bancário resulta em malinvestments. Como esses precisam de ser liquidados, o governo deve seguir uma política de “nada fazer” que permita aos mercados regressar a condições normais. Quando esta política foi seguida, na depressão de 1873, a recuperação da depressão não levou mais que poucos anos, contrastando com o falhanço total da recuperação durante o New Deal. Os resultados foram ainda melhores durante a depressão de 1920-1921, quando Wilson e Harding cortaram na despesa governamental: a depressão de 1920-1921 foi tão curta que muitos americanos não sabem da sua existência. (p.71)

Murphy trata de forma minuciosa as múltiplas medidas do New Deal e os seus manifestos falhanços. Devo-me confinar a notar a sua condenação lancinante da política do ouro de Roosevelt.

Ordenar ao público para entregar o seu ouro – sob uma pena de multa de 10.000$ e dez anos de prisão – foi um roubo claro… No entanto, por muito pérfido que este explícito confisco tenha sido, o cancelamento das cláusulas de ouro em contratos foi, de certa forma, uma violação mais fundamental dos direitos de propriedade… o sector privado não teve escolha a não ser usar os pedaços de papel verde não apoiados [por ouro] como a fundação das suas transacções. Os americanos estavam então inteiramente à mercê daqueles que controlam a impressora (pp. 128-129)

Murphy leva a sua discussão para o período da II Guerra Mundial. Aqui ele foi fortemente influenciado pelo desafio de Robert Higgs à visão convencional de que a guerra acabou com a Depressão. (Ele também faz um uso excelente da “incerteza de regime” de Higgs na sua explicação do falhanço do New Deal). Ele argumenta que as loucuras do planeamento central se alargaram para a condução da guerra. As empresas privadas podiam ter melhor gerido a produção de bens militares do que fizeram os controlos.

É um facto simples da ciência que a produção enorme de tanques, aviões e outros bens do tempo de guerra nos anos 40 necessitassem de um forte corte no consumo civil. Mesmo assim, o governo não precisava de ter imposto racionamento directo e outros controlos na frente interna. Em vez disso, o governo podia ter simplesmente aumentado os impostos e emitido novos títulos de dívida de forma a comprar os produtos desejados de empreiteiros militares e outras firmas… As empresas individuais, procurando apenas aumentar os lucros, seriam guiadas por uma mão invisível para se reorganizarem na produção civil e forneceriam, ao invés, para o esforço de guerra. (pp. 158-159)

O argumento de Murphy relembra a sugestão de Mises de que os franceses se teriam dado muito melhor na guerra se tivessem confiado nas empresas privadas na procura de armamento 1 Ver Mises, Interventionism: An Economic Analysis e a minha análise em The Mises Review Summer 1998.

Nestes dias de massivos resgates e intevenções governamentais, as lições da Grande Depressão e do New Deal têm muito mais do que um significado histórico. Murphy conclui com uma nota melancólica:

O pacote de estímulo do Presidente Obama e outros “remédios” não irão curar as nossas desgraças económicas mais do que o New Deal curou a Grande Depressão. A verdadeira questão é se o New Deal de Barack Obama, a construir-se sobre o antigo, irá afundar finalmente a economia americana na areia. (p.177)

Se as pessoas suficientes lerem o livro forte de Murphy, podemos estrangular no berço a receita de Obama para o desastre económico.

Referências   [ + ]

1. Ver Mises, Interventionism: An Economic Analysis e a minha análise em The Mises Review Summer 1998.

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